Se minha resenha contivesse apenas as informações de que o filme é estrelado por Lucille Ball e Desi Arnaz, com a direção de ninguém menos que Vincent Minnelli, já seria motivo suficiente para correr e assistir, com a certeza de que a diversão está garantida.
Lançada na carona do enorme sucesso da série I Love Lucy, também protagonizada pelo casal, a comédia Lua de Mel Agitada foge do estilo datado de muitos longas dos anos 50, que percebemos hoje em dia o quanto envelheceram mal, e ainda consegue arrancar boas risadas do público.
O filme conta a história do casal Nicky e Tacy, recém-casados que tem a péssima ideia de morar em um trailer e viajar pelo país em lua de mel. Logo de cara já sabemos que a relação dos dois teve sérios problemas, pois vemos na primeira cena o rapaz dirigindo na chuva atrás de sua esposa, que havia sumido dias antes após uma briga. Através de um flashback, somos redirecionados ao início de tudo, quando os dois ainda estavam planejando o casório e tentando encontrar a casa perfeita ao estilo american dream. Só que se sua noiva é Lucille Ball você não pode esperar que seja uma residência convencional, não é mesmo?! Por conta da profissão de seu futuro marido, que precisa estar sempre viajando, a jovem tem como brilhante solução para seus problemas comprar um trailer, ao invés de uma casinha com cerca branca, pois desta maneira ela poderá sempre acompanhar seu amado, e ele por sua vez não precisará ficar em hotéis, porque estará sempre em casa.
Apesar de relutar um pouco, Nicky acaba sendo persuadido de que havia uma certa lógica no raciocínio e, ao encontrarem um trailer encantador com diversas facilidades de pagamento, o rapaz acaba cedendo e aceitando sua nova moradia. As coisas já demonstram que não vão ser como os dois idealizaram quando as tais facilidades de pagamento fazem valer o ditado 'quando a esmola é demais, o santo desconfia', pois apesar do preço aparentemente amigável, surgem inúmeras despesas subsequentes, como manutenções e equipamentos de segurança para acoplar o trailer no carro, além da necessidade de comprar até mesmo um novo veículo.
Após o casamento, a rotina do casal também não é muito melhor, com problemas que vão desde pequenas dificuldades de adaptação, como o posicionamento do chuveiro e o uso do freio do carro, até enormes confusões com a movimentação excessiva na cozinha, ficar atolado na lama no meio da noite e arriscar uma subida íngreme com o trailer cheio de tralhas.
Não é de se estranhar que até o mais apaixonado dos casais acabe discutindo ao se ver envolvido em tamanho pandemônio. Nicky e Tacy tem uma terrível briga quando o rapaz descobre que a esposa arriscou a segurança de ambos mentindo ao dizer que se desfez de todo o excesso de peso que levavam, como rochas que pegaram de recordação e presentes de casamento. Após o desentendimento, Tacy vai embora e Nicky passa dias procurando a moça, voltando assim ao ponto de início do filme. Será que ainda existe chance para este triângulo amoroso, formado por Nicky, Tacy e.. o trailer?
Problematizando
Tudo bem, pra não dizer que minha veia feminista não se manifestou em nenhum ponto do filme, preciso dizer que me incomodou um pouco o fato de ser sempre a Lucy que causava a maioria dos problemas e confusões, sendo bem cabecinha de vento, enquanto o marido era sempre o racional, mas acabava sendo persuadido por ela a fazer coisas que claramente tinham tudo para dar errado. Esse tipo de coisa sempre é utilizada para reforçar o esteriótipo de que é o homem, o marido, que deve pensar e ser o responsável por tomar as decisões. Assim como o fato de Lucy interpretar a típica 'mulher casada anos 50', a dona de casa que ama cuidar do marido. Você pode pensar nesse momento que talvez eu esteja sendo chata e exagerando um pouco, no entanto tais fatos eram realmente bastante comuns na época, e constantemente reforçados pelo cinema e por outros meios de comunicação, como revistas e propagandas.
Para uma mulher muitas vezes é incômodo ver como os papéis femininos na sociedade eram limitados, basicamente com uma lavagem cerebral da mídia e de sua própria comunidade reforçando sempre a ideia de que seu dever era cuidar do marido e dos filhos e que seu lugar era em casa, que nunca seria inteligente o bastante para o mundo dos negócios ou mesmo para tomar uma decisão quanto um homem. O cinema, principalmente as comédias para a família da década de 50, reafirmavam categoricamente essa condição, assim como falei brevemente também na resenha de Confidências à Meia-Noite, só que nesta matéria abordando mais sobre as mulheres solteiras.
No entanto, como foi dito no início deste artigo, o filme de maneira nenhuma se torna datado, já que essas questões não são o foco da história. Além do mais, é preciso entender que Lucille Ball é a protagonista, conhecida por suas caras e bocas e seu dom para o humor, e é fundamental que a maioria das cenas de comédia tenham ela como estrela, logo é compreensível que as trapalhadas sejam feitas por ela.
O filme está sendo lançado pela Obras-Primas do Cinema, em uma edição 'Dose Dupla', junto com outro clássico estrelado pela atriz: Os Seus e Os Nossos (Yours, Mine and Ours, 1968), onde atua ou lado do ex-namorado de juventude, Henry Fonda. Clique aqui para ler a matéria Um pouco sobre Lucille Ball, Obras-Primas e Dose Dupla
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