Embora o cinema seja uma arte, ele também é sinônimo de lucros e negócios. O 'Star system' (sistema de estrelas) era extremamente comum em Hollywood, consistindo em longos contratos com atores (as), onde os estúdios controlavam toda a sua carreira. Isso incluia trabalhos, treinamentos, publicidade e também a imagem. Como 'persona' podemos entender um 'personagem fictício', uma imagem representativa para o público. Com isso, eram criados estereótipos, que muitas vezes limitavam o talento e as escolhas artísticas dos atores. Entretanto, era algo muito lucrativo para os estúdios, que podiam lançar diversos filmes e vender repetidamente as imagens que mais agradássem a audiência. Abaixo, alguns exemplos de atores e atrizes que passaram por mudanças destas personas em suas carreiras:
*Obviamente, todos os citados fizeram diferentes filmes. A postagem é sobre uma imagem 'geral'.
Marilyn Monroe - Femme fatale x Loira burra
No início de sua carreira, Marilyn Monroe fez uma série de participações em diferentes filmes até conseguir seu lugar ao sol. Conforme seus papéis foram melhorando, houve um breve esboço de 'mulher fatal' em suas personagens. Podemos pegar como exemplo filmes como 'O Segredo das Jóias' (The Asphalt Jungle, 1950), 'Almas Desesperadas' (Don't Bother to Knock, 1952) e, principalmente, 'Torrente de Paixão' (Niagara, 1953). Neste último, a atriz ganhou bastante atenção do público. Com isso, seu visual de cabelos platinados e curtos, batom vermelho e sobrancelhas arqueadas tornou-se definitivo.
Com o estrondoso sucesso de 'Os Homens Preferem as Loiras' (Gentlemen Prefer Blondes, 1953), a 20th Century Fox viu que tinha uma mina de ouro em suas mãos. Assim, Marilyn passou a interpretar uma série de personagens no estilo 'sexy e inocente', que a consolidou como uma das atrizes mais famosas de Hollywood. Alguns de seus trabalhos mais conhecidos são 'Como Agarrar Um Milionário' (How to Marry a Millionaire, 1953), 'O Pecado Mora ao Lado' (The Seven Year Itch, 1955) e 'Quanto Mais Quente Melhor' (Some Like It Hot, 1959). Percebendo o potencial de Monroe nas bilheterias, surgiram atrizes como Jayne Mansfield, Diana Dors e Mamie Van Doren. Apesar da fama, Monroe odiava o estereótipo de 'loira burra' que passou a lhe acompanhar.
Dick Powell - Astro de musicais x Protagonista 'durão'
Com talento vocal e presença de palco aliados ao jeito de bom moço, Dick Powell tornou-se um dos nomes mais frequentes dos musicais na década de 30. Filmes como 'Cavadoras de Ouro' (Gold Diggers of 1933), 'Rua 42' (42nd Street, 1933) e 'Mulheres e Música' (Dames, 1934) o tornaram um astro do gênero, atuando frequentemente ao lado de Ruby Keeler e Joan Blondell, que foi sua esposa de 1936 até 1944.
Com a chegada dos anos 40, Powell começou a se sentir muito velho para seus antigos personagens, testando sua sorte em papéis mais dramáticos. Com o êxito de 'Até a Vista, Querida' (Murder, My Sweet, 1944), o ator conseguiu revigorar sua carreira, protagonizando clássicos noir como 'Johnny O'Clock' (1947) e 'Caminho da Tentação' (Pitfall, 1948). Posteriormente, passou também a ser diretor de cinema.
Myrna Loy - Mulher exótica x Dona de casa americana
Myrna Loy começou sua carreira ainda no cinema mudo, passando com sucesso para a era do som. Entretanto, em seus primeiros anos como atriz, ela não era exatamente uma estrela. Interpretando frequentemente as chamadas 'mulheres exóticas', ela era escalada para as mais diversas etnias. Não era raro vê-la como personagens asiáticas ou do leste europeu. As vilãs ou apenas antagonistas também eram comuns em sua filmografia. Alguns exemplos são longas como 'A Guarda Negra' (The Black Watch, 1929), 'A Máscara de Fu Manchu' (The Mask of Fu Manchu, 1932) e'Treze Mulheres' (Thirteen Women, 1932).
Apesar de nem sempre ter bons papéis, Myrna era presença constante nos filmes da época, aparecendo em no mínimo sete produções por ano. Sua popularidade aumentou consideravelmente após ser apontada como a atriz favorita do lendário ladrão de bancos John Dillinger, que foi morto saindo do cinema, após assistir 'Vencidos Pela Lei' (Manhattan Melodrama, 1934). O grande ápice da mudança de persona em sua carreira foi a personagem Nora Charles, em 'A Ceia dos Acusados' (The Thin Man, 1934). O longa, que mistura comédia e suspense, fez com que suas habilidades como atriz fossem reconhecidas por público e crítica, fazendo um enorme sucesso e tendo uma série de continuações. A parceria ao lado de William Powell também se repetiria diversas vezes, eternizando-os como uma das grandes duplas do cinema. Eleita 'Rainha de Hollywood' na década de 30, fez clássicos como 'Ciúmes' (Wife vs. Secretary, 1936), 'Os Melhores Anos de Nossas Vidas' (The Best Years of Our Lives, 1946) e 'Lar, Meu Tormento' (Mr. Blandings Builds His Dream House, 1948).
Vincent Price - Coadjuvante de luxo x Rei do terror
Vincent Price já flertava com o terror desde seus primeiros papéis, quando atuou em filmes como 'A Torre de Londes' (Tower of London, 1939) e 'A Volta do Homem Invisível' (The Invisible Man Returns, 1940). Apesar disso, de maneira geral, sua carreira durante a década de 40 se manteve estável com personagens de destaque em clássicos como 'A Canção de Bernadette' (The Song of Bernadette, 1943), 'Laura' (1944) e 'Amar Foi Minha Ruína' (Leave Her to Heaven, 1945).
Nas décadas seguintes até o final de sua vida, o ator continuou atuando em longas dos mais diversos gêneros, como 'Champanhe para César' (Champagne for Caesar, 1950), 'Os Dez Mandamentos' (The Ten Commandments, 1956) e 'As Baleias de Agosto' (The Whales of August, 1987). Mas, em uma espécie de carreira paralela, foi nos filmes de terror que Price encontrou seu verdadeiro lugar como protagonista. Neste período, destaca-se sua lendária parceria com o diretor Roger Corman e as diversas adaptações das obras de Edgar Allan Poe. As produções de baixo orçamento, ligeiramente trash, o estabeleceram como um dos reis do horror, em filme como 'Museu de Cera' (House of Wax, 1953), 'A Casa dos Maus Espíritos' (House on Haunted Hill, 1959) e 'O Corvo' (The Raven, 1963).
Joan Bennett - Loira ingênua x Femme fatale x Dona de casa americana
Os cabelos loiros e as feições delicadas davam uma imagem inocente à jovem Joan Bennett, que começou a atuar ainda no cinema mudo. Durante os anos 30, mantendo sua posição de mocinha, ela esteve em clássicos como 'Bulldog Drummond' (1929), 'Eu e Minha Pequena' (Me and My Gal, 1932) e 'As Quatro Irmãs' (Little Women, 1933).
Apesar de já ser uma estrela de sucesso, foi na década de 40 o auge de sua carreira. Com os cabelos escuros e penteados glamourosamente, ela transformou-se em uma das femme fatales mais importantes dos filmes noir, protagonizando clássicos como 'Um Retrato de Mulher' (The Woman in the Window, 1944), 'Almas Perversas' (Scarlet Street, 1945) e 'O Segredo da Porta Fechada' (Secret Beyond the Door, 1947).
Em 1951, a atriz foi envolvida em um escândalo, quando seu marido Walter Wanger atirou em seu agente, Jennings Lang, acreditando que os dois estavam tendo um caso. Lang foi socorrido e sobreviveu. Alegando insanidade temporária, Wanger foi solto sob fiança. O romance extraconjugal foi negado por ambos, que afirmaram estar em um encontro de negócios, sobre um projeto na televisão. Apesar de tudo ter sido esclarecido, a carreira de Joan sofreu um grande abalo. Com dificuldades para bons papéis, ela precisou se reinventar novamente, com personagens menores, geralmente de esposas e donas de casa. Ela apareceu em longas como 'O Pai da Noiva' (Father of the Bride, 1950) e sua continuação, 'Netinho do Papai' (Father's Little Dividend, 1951) e 'Não Somos Anjos', também conhecido como 'Veneno de Cobra' (We're No Angels, 1955). Nos anos seguintes, Bennett se dedicou ao teatro e continuou aceitando convites para o cinema.
Olivia de Havilland - Mocinha ingênua x Lei De Havilland
Na década de 30, Olivia De Havilland era a personificação do termo 'mocinha', atribuído às heroínas de filmes. Sua beleza delicada e seus modos elegantes a tornaram perfeita para papéis de jovens românticas. A química com o astro Errol Flynn rendeu uma parceria de sucesso nas telas, geralmente em filmes de aventura ou faroestes. A atriz também apareceu em filmes como 'Adversidade' (Anthony Adverse, 1936), 'Uma Loira Com Açucar' (The Strawberry Blonde, 1941) e 'A Porta de Ouro' (Hold Back the Dawn, 1941). Seu papel de maior destaque foi como a doce Melanie no clássico 'E o Vento Levou' (Gone With the Wind, 1939).
Apesar de ser protagonista na maior parte de seus trabalhos, Olivia estava cansada do estereótipo de boa moça e da falta de profundidade de suas personagens. Sob contrato com a Warner, ela recusou diversos projetos, que a levaram a ser suspensa pelo estúdio. Ao final de seu contrato de sete anos, o estúdio acrescentou seis meses que deveriam ser cumpridos por Olivia, pelo período em que ela esteve suspensa. Aconselhada por seu advogado, ela decidiu processar a Warner em 1943. Em um movimento inédito e inesperado, a justiça concedeu a vitória para Olivia, reduzindo o poder dos estúdios sobre os atores e sendo nomeada como 'Lei De Havilland'. Embora tenha sido inicialmente boicotada, ela voltou a trabalhar, finalmente interpretando diferentes personagens. Vencendo duas vezes o Oscar de Melhor Atriz, pelos longas 'Só Resta Uma Lágrima' (Só Resta uma Lágrima (To Each His Own, 1946) e 'Tarde Demais' (The Heiress, 1949), ela também atuou em filmes como 'Espelho d'Alma' (The Dark Mirror, 1946), 'A Cova da Serpente' (The Snake Pit, 1948), e 'Com a Maldade na Alma' (Hush...Hush, Sweet Charlotte, 1964).
Peter Lorre - Protagonista excêntrico x Coadjuvante de luxo
Peter Lorre ganhou fama mundial ao interpretar um psicopata no filme alemão 'M, O Vampiro de Dusseldorf' (M - Eine Stadt sucht einen Mörder, 1931). Apesar de sua atuação excepcional, Lorre estava longe de ter a aparência esperada para um protagonista romântico. Assim, sua carreira se desenvolveu, principalmente, com papéis de anti-heróis, como 'O Homem Que Sabia Demais' (The Man Who Knew Too Much, 1934), 'Crime e Castigo' (Crime and Punishment, 1935) e 'Dr. Gogol - O Médico Louco' (Mad Love, 1935). O ator também fez bastante sucesso com 'O Misterioso Mr. Moto' (Think Fast, Mr. Moto, 1937), onde interpreta um detetive japonês, que gerou uma série com sete continuações. Embora tenha protagonizado filmes de baixo orçamento como 'O Homem dos Olhos Esbugalhados (Stranger on the Third Floor, 1940), um vislumbre de declínio começava a se desenhar.
Em 1941, sua carreira adquiriu um novo fôlego, agora em uma posição de coadjuvante, porém em grandes clássicos, como 'O Falcão Maltês' ou 'Relíquia Macabra' (The Maltese Falcon, 1941), 'Casablanca' (1942) e 'Este Mundo é um Hospício' (Arsenic and Old Lace, 1944). O ator apareceu em diversas produções no cinema e na televisão durante os anos 40 e 50. Em seus últimos anos, ele se juntou a nomes como Vincent Price e Boris Karloff,, tornando-se um dos mestres do terror na década de 60, em longas como 'Muralhas do Pavor' (Tales of Terror, 1962) e 'O Corvo' (The Raven, 1963).
Dorothy Malone - Boa moça x Loira fatal
Dorothy Malone começou a atuar nos anos 40. Embora tenha chamado a atenção em sua breve participação em 'À Beira do Abismo' (The Big Sleep, 1946), a jovem atriz era constantemente escalada em faroestes. Apesar de alguns papéis principais, suas personagens eram muitas vezes apenas o interesse amoroso do protagonista. Com olhos marcantes e cabelos escuros, sua aparência de boa moça limitava sua personalidade nas telas. Segiram-se filmes como 'Golpe de Misericórdia' (Colorado Territory, 1949), 'O Tesouro do Bandoleiro' (The Nevadan, 1950) e 'Morrendo de Medo' (Scared Stiff, 1953).
Os cabelos loiros deram a Dorothy uma personalidade sensual e ousada, que permitiu que ela mostrasse todo o seu potencial no drama 'Palavras ao Vento' (Written on the Wind, 1956). Embora fosse uma personagem secundária, a atriz roubou a cena e garantiu seu Oscar de coadjuvante. Sua nova aparência e a estatueta em sua estante ajudaram a torná-la uma estrela, podendo brilhar em diferentes gêneros. Ela esteve em clássicos como 'Almas Maculadas' (The Tarnished Angels, 1957) e 'O Homem das Mil Caras' (Man of a Thousand Faces, 1957). Ela também protagonizou a série de televisão 'Peyton Place', de 1964 até 1968.
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