Sexo. Eis um dos temas centrais mais recorrentes nas comédias-românticas americanas. Com a implementação do Código Hays em 1934, elementos como nudez e insinuações sexuais e homossexuais foram basicamente banidos das produções cinematográficas. Com isso, os roteiristas e diretores tinham que ser bastante criativos e sutis para levar adiante seus projetos mais ousados, já que qualquer coisa que parecesse imoral seria barrada pela censura.
Tom Ewell e Marilyn Monroe em cena de O Pecado Mora ao Lado
Longas como O Pecado Mora ao Lado (The Seven Year Itch, 1955), Um Amor na Tarde (Love in the Afternoon, 1957) e Gigi (1958), exploravam o assunto com insinuações e situações engraçadas, porém de maneira inocente e sem deixar de lado a moral e os bons costumes da época. Uma das comédias sexuais de maior sucesso durante a década de 50 foi Confidências à Meia-Noite (Pillow Talk, 1959), estrelada pela dupla Doris Day e Rock Hudson. Como já era tradição, Doris interpreta uma mulher virgem que se vê no dilema entre manter sua castidade até a noite de núpcias ou se
entregar ao homem que ama mesmo sem uma aliança no dedo, como uma mulher moderna e independente. Às portas da Revolução Sexual dos anos 60, muitas mulheres estavam acostumadas a trabalhar e ter sua independência financeira, mas a virgindade e o casamento continuavam sendo um tabu na moralista sociedade americana da época, com esteriótipos reforçados pelo cinema.
Doris Day e Rock Hudson em foto publicitária de Confidências à Meia-Noite
No filme, Doris interpreta uma mulher que se vê atormentada com uma linha cruzada que a faz testemunhar as conversas entre um homem mulherengo (Rock Hudson) e suas inúmeras conquistas do sexo feminino. Irritado com as interferências da jovem em suas ligações e ao mesmo tempo atraído por sua beleza, ele decide fingir ser um inocente e cavalheiro texano, com o intuito de seduzir a moça, aproveitando-se do fato dela nunca ter visto seu rosto antes. Obviamente, o rapaz acaba se apaixonando por ela e os dois terminam felizes para sempre. Embora seja bastante datado para os dias de hoje, e até mesmo para a época, o filme consegue ser maravilhoso e extremamente cativante, justificando o enorme sucesso que fez no período de seu lançamento. (
Veja a resenha aqui)
Se fez sucesso, vamos repetir!
Cena de Volta Meu Amor, remetendo aos famosos telefonemas com a tela dividida do longa de 1959
Na carona do enorme êxito de seu trabalho anterior, a dupla se reuniu novamente em 1961, no filme Volta Meu Amor. Além do casal principal, temos novamente a presença de Tony Randall, como um coadjuvante de luxo, que rouba a cena em ambos os longas. Mas as coincidências entre as duas produções não pararam por aí! O grande problema é que, embora este também seja um ótimo filme, com situações cômicas e todo o charme da década e de seus protagonistas, o roteiro é basicamente uma cópia de Confidências à Meia-Noite.
Doris Day vive Carol Templeton, uma publicitária trabalhadora e muito criativa que tenta subir em sua carreira por seus próprios méritos. Ela tem como principal concorrente o mulherengo Jerry Webster, que busca conquistar seus clientes com métodos bastante opostos aos seus, através de mulheres, festas e bebidas. Irritada por perder oportunidades por conta da manipulação de Webster, ela decide denuncia-lo ao conselho de ética, tendo como principal testemunha uma das modelos que ele usa para seduzir os clientes, Rebel Davis. Ao descobrir o que Carol planeja, o rapaz rapidamente inventa para Rebel que ela se tornará uma celebridade imediata ao estrelar a campanha de um produto revolucionário chamado VIP, fazendo assim com que ela desista de depor contra ele.
Tudo se complica quando, acidentalmente, o tal produto revolucionário, que na realidade não existe, é anunciado para o público, com direito a data de lançamento e outdoors promocionais por toda a cidade. Com a confusão armada e seu emprego em jogo, só resta a Jerry recorrer ao cientista Linus Tyler, implorando para que ele crie algo inovador que possa ser vendido como o já famoso VIP. Ao saber que a agência de Jerry ainda não fechou a conta com Dr Linus, Carol decide ir procura-lo para tentar passar a perna em seu rival. Como não o conhece pessoalmente, a bela loira é facilmente enganada por Jerry, que decide se passar por Linus para se vingar de toda a confusão criada por causa de sua denúncia.
Caso você não tenha assistido ainda ao filme, a partir daqui, a resenha terá spoiler, então pare de ler agora. O DVD do longa foi lançado pela Classicline e pode ser encontrado nas melhores lojas do ramo. (
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Um ótimo filme com um final ruim
Fingindo ser Linus, Jerry cria uma persona totalmente diferente de seu próprio estilo, como um cientista tão dedicado ao trabalho que quase não teve experiências com o sexo oposto, fazendo com que Carol logo se apaixone e se sinta a vontade para ter um relacionamento com um jovem tão respeitador e inexperiente. Sexualmente atraída por ele, a moça até cogita ir para a cama com seu novo pretendente mas como já era de se esperar, a farsa de Jerry é descoberta antes que o ato seja consumado.
Neste ínterim, o verdadeiro Dr Linus acaba criando o bendito VIP, que nada mais é do que uma espécie de pastilhas que tem o efeito da ingestão de álcool no corpo humano. Carol e Jerry acabam provando a invenção e, após um corte de cena, acordam em uma cama de hotel e descobrem terem feito sexo na noite anterior. Mas, calma! Graças à própria Doris Day, que insistiu para que a cena fosse reescrita, antes de perder a virgindade, Carol, mesmo doidona, teve a preocupação de casar-se com Jerry para não ser desonrada. O casamento acaba sendo anulado, porém após nove meses, Jerry descobre que sua amada está prestes a dar à luz e vai correndo até o hospital para que os dois façam as pazes e terminem felizes para sempre como uma típica família americana.
Apesar da enorme forçação de barra do final, o filme não deixa de ser delicioso e divertidíssimo, além do prazer de ver em cena atores que amamos como Doris Day, Rock Hudson e Tony Randall, como o chefe inseguro de Jerry, que acaba lançando por engano os comerciais de VIP. Embora não seja um musical, a trilha sonora do longa tem duas canções executadas por Doris Day, sendo elas a música de abertura, 'Lover Come Back', e 'Should I Surrender', cantada como se fosse o pensamento musicado de Carol. Embora seja bem semelhante ao enredo de Confidências è Meia-Noite, Volta Meu Amor foi indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original.